Por mais interpretações que se faça sobre as razões que levaram 60% dos eleitores açorianos a abster-se, quase todas culpando forças políticas e governantes, uma há que me parece ser a mais razoável: os açorianos sentem que a Assembleia da República e o Governo da Nação, pouco interferem nas suas vidas.
Afastados milhas e milhas de Lisboa, eles sabem que quem governa o arquipélago é o Governo Regional, mais que o Parlamento Açoriano.
Carlos César e anteriormente Mota Amaral, perceberam isso bem.
É, por isso, muito leviano extrapolar os resultados das últimas eleições. Os açorianos já aprenderam que só as matérias da justiça, das forças armadas e militarizadas escapam à tutela regional. Quanto aos negócios estrangeiros, no que toca aos Açores, eles são tratados no seio das instituições representativas das regiões da União Europeia ou, por outro lado, com a ajuda dos representantes da nossa comunidade emigrante dos EUA e Canadá. Esta tem sido a prática, ao longo de mais de três décadas de governo próprio, pese embora os embaraços causados aos inquilinos do palácio das Necessidades.
A tensão que a autonomia açoriana gerou, desde o início, com os poderes centrais lisboetas, por mais que se tente camuflar, é percebida pelo povo que há muitos e muitos anos, foi votado à distância e ao abandono. Foi assim no tempo dos Capitães-Generais, no Estado Novo com os ex-Distritos e ex-Juntas Gerais das ilhas adjacentes, e até no consulado de Cavaco Silva, antes da aprovação da Lei das Finanças Regionais.
Quando representantes dos orgãos de sobenaria e líderes partidários aqui vêm em funções oficiais e políticas, relevam, normalmente, os méritos da autonomia constitucional, mas, de imediato, sobrevalorizam a unidade nacional. Esquecem-se que os açorianos, sobretudo os residentes em ilhas menos populosas, lá vivem numa autêntica missão de soberania que o Estado não reconhece. A sua mentalidade colonialista evidencia-se, também, quando esses políticos atacam decisões legítimas do governo autónomo ou do parlamento regional democrático, como aconteceu, há tempos, com a rejeição pelo Presidente da República do Estatuto Político Administrativo.
O actual inquilino de Belém, que às novas tecnologias dá alguma importância, ignorou, sintomaticamente, na página oficial da presidência, a lista das dez personalidades e instituições açorianas a quem, no dia de Portugal atribuíu condecorações. Por aqui se vê a consideração que o Chefe do Estado tem pelos açorianos...
Perante este cenário, cabe aos orgãos de governo próprio dos Açores e a outros responsáveis açorianos, um papel relevante na descoberta de novas vias de progresso e desenvolvimento para as populações destas nove ilhas.
A crise económica e social que abala a União Europeia dos 27, não será ultrapassada pela alternância das viragens à direita ou à esquerda, enquanto se mantiver o atual paradigma económico e financeiro que levou à bancarrota alguns países, mais por culpa dos donos do capital, os quais, sem escrúpulos nem regras, acumulam, impunemente, fortunas fabulosas.
Os Açores devem encontrar vias diferentes de desenvolvimento. A economia do futuro assentará no ambiente, nas energias renováveis e na proteção da natureza; na ZEE e nas enormes potencialidades dos fundos marinhos; na aposta na agricultura biológica; na economia da saúde, do bem-estar e dos tempos livres; na localização geo-estratética do arquipélago no apoio às tecnologias da informação e comunicação; e numa aposta forte na formação profissional e técnica dos trabalhadores para desenvolver estas áreas.
À Universidade dos Açores está reservado um papel fulcral e determinante na investigação e conceção de projetos criativos e inovadores que envolvam empresários e investidores.
Não há tempo a perder.
Os açorianos têm na sua matriz genética um dinamismo que os levou a construir novas pátrias além-mar, sem passagem de regresso.
Chegou a hora de ficar e de chamar os que partiram para construirmos aqui uma nova ordem económica, configurada com a dimensão das ilhas, do mar, do ambiente e da beleza que nos distingue.
Este é um projeto consistente e com futuro.
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